Tensão vs. Conflito: Qual é a diferença?
Tensão e conflito são elementos cruciais em qualquer boa história. Por mais que estejam relacionados, são princípios distintos que ajudam a construir o drama e manter os leitores envolvidos até o final da obra. Uma boa tensão torna a sua escrita cativante e repleta de suspenses, além de manter os leitores colados em sua história até o final quando bem combinada com o conflito.
De início, iremos abordar apenas a borda do que tange o significado e a função dos dois, mas, ao longo da explicação, você irá entender os significados, manifestações e utilização de ambos.
O que é “Tensão”?
Na literatura, tensão é a sensação de que algo tenebroso está para acontecer em determinado momento. A construção de boas tensões costumam engajar os leitores para que continuem a ler até o fim da história.
Exemplo: Obras de mistério são cheias de Tensão e Foreboding — relacionado ao Foreshadowing e significa presságio — e, no geral, apresentam trechos tensos do início ao fim. Trabalhar com este gênero de escrita é uma ótima forma de aprender como aplicar tensão em seu arco narrativo.
Então o que seria “Conflito”?
O Conflito pode surgir de diferentes formas em uma história; de lutas físicas até um diálogo passivo-agressivo entre namorados. Para ocorrer um Conflito, na literatura, tudo o que se precisa é uma manifestação de oposição ou incompatibilidade entre um personagem e algo.
Este é um dos princípios fundamentais da escrita criativa e narrativa. Para escrever uma história que valha a pena ler, é necessário personagens cujos os ideais estejam sendo desafiados e que coisas opostas a isso aconteçam. Sem Conflito, não haverá narrativa ou qualquer arco de personagem significativo.
Quais as diferenças entre os dois?
Enquanto a “Tensão” fervilha sob a superfície — que acontece devagar e em seu tempo — o “Conflito” geralmente é bem exposto... Ele é, como podemos chamar, a “tensão óbvia”.
A Tensão pode estar presente através da rivalidade implícita entre o protagonista e o antagonista, ou mesmo na consciência dos leitores através de um desastre iminente que eles sabem que vai acontecer, mas os personagens não.
Já o Conflito, por outro lado, envolve um confronto ativo: a porradaria entre o protagonista e o antagonista, um debate de ideologias diferentes, um personagem tenha que sobreviver na selva e precisa lutar contra lobos ou mesmo precisa prevenir uma catástrofe climática. Mesmo no conflito interno, ainda envolve forças opostas lutando pela supremacia.
Obs.: Enquanto a tensão está ligada ao sentimento de que algo pode acontecer, o conflito é a cena de fato.
Por que Tensão é importante na história?
Como dito antes, a Tensão pode existir entre personagens, como um tema geral ou mesmo uma ferramenta estrutural, mas deve-se entender que é uma parte integrante do pacing e da exposição. Em uma visão mais direta, construir a Tensão na narrativa é uma questão de manter o leitor preso na história. Esse tipo de investimento emocional depende de riscos; essas que se não existirem, pode-se afirmar que não existe uma história. Esteja escrevendo uma novel ou um livro, são esses riscos, tomados pelo leitor, que manterão seu leitor entretido para mais daquilo.
A tensão não é um assunto fácil. Para entender sobre, pense como nela como a linha de pensamento que conecta os pontos da trama, da subtrama e os desenvolvimentos de personagens. Ela se manifesta por meio do acúmulo de suspense que aumenta conforme ocorreu uma mudança na situação do protagonista.
É importante ressaltar que mesmo os profissionais mais experientes têm dificuldade em mantê-la do início ao fim, então não se preocupe caso não tenha entendido de primeira.
De que maneiras a Tensão pode se manifestar?
Vamos listar as formas mais comuns de manifestação da Tensão que você pode aplicar em sua obra.
1 - Foreshadowing (prenúncio)
Uma parte importante da construção da Tensão é o uso do foreshadowing para a tensão dramática. Veja, por exemplo, em Harry Potter, a autora utiliza flashbacks e a história de fundo para prenunciar o eventual grande conflito que acontecerá entre Harry Potter e Voldemort.
Também temos um vídeo em nosso canal onde explicamos um pouco sobre a ferramenta, acesse clicando aqui.
2 - Acontecimento incitante
Na maioria das obras, há um acontecimento incitante que coloca tudo em movimento para os personagens principais. É tão variante que pode ser uma decisão crucial ou uma briga de socos, mas, de qualquer forma, as coisas mudam por conta disso e apresentam uma nova visão para a obra. Leve como exemplo em obras de cultivo, onde há algum objetivo mais básico de alcançar tal nível que era dito o mais superior e se descobre que há um novo mundo acima, onde esse “nível” não passa do mais baixo.
3 - Tempo limite
O relógio é um recurso central na maioria dos suspenses. Uma das ferramentas mais críticas para gerar suspense é comprimir a linha do tempo de uma história para que os personagens fiquem sob mais pressão. A imposição de um tempo limite injeta um pouco de estresse e adrenalina ao enredo. Uma corrida contra o relógio — seja um real ou um prazo iminente — cria tensão natural e acelera os personagens em novas situações. Imagine colocando um limite de tempo em uma ação que seu protagonista deve realizar; só isso já cria uma Tensão para a sua obra e ao leitor.
4 - Informações omitidas
Invés de contar ao leitor de uma só vez o que um personagem descobre ao entrar em uma situação de suspense, use a descrição para prolongar o momento e construir a Tensão. Comece por escrever uma descrição incompleta — o suficiente para despertar a curiosidade do leitor. Crie um obstáculo para os personagens, algo que os distraia. Em seguida, dê outra dica sobre o que eles acham que veem... Mas, claro, não explique totalmente. Encontre maneiras de arrastar a descrição até que seus leitores finalmente consigam imaginar.
5 - Plot Twist (reviravolta)
Um plot twist na história cria Tensão ao acabar com os planos elaborados de seu protagonista. Isso pode ser sugerido ao longo da narrativa usando foreshadowings. Dependendo da reviravolta, seus personagens precisarão se adaptar às novas circunstâncias.
6 - Conflito
Apenas o Conflito faz uma história avançar — então, taca-lhe problemas novos! Crie obstáculos para o protagonista. Se você criou uma situação difícil para o seu personagem principal enfrentar, aumente ainda mais a dificuldade. Se você sempre der aos seus personagens o que eles desejam, sua história perderá a Tensão. Isso é o que seus personagens precisam para crescer, então não os deixe lidar com as situações facilmente. Mostre o que seus personagens querem e os impeça de conseguir. O mais importante é lembrar que um conflito deve aumentar à medida que a história avança.
E não imagine o Conflito apenas como uma ação física, porque ele pode surgir de diferentes formas, por exemplo...
6.1 - Conflito interno
Às vezes, o conflito interno e a dúvida podem surgir durante o desenvolvimento do caráter e usado para criar níveis de Tensão. Em Hamlet, o personagem principal deseja vingar a morte de seu pai, mas é assediado por dúvidas, indecisões e tensão mental. Como público, há uma sensação de tensão em cada cena enquanto esperamos para ver se Hamlet agirá de acordo com o seu desejo interior de retribuição ou se permanecerá preso com a indecisão.
7 - História de fundo
Dê a um personagem uma história complicada. Revelar os traços de seu caráter do seu protagonista à medida que você desencadeia seu conflito interno pode ser uma fonte eficaz de Tensão. O protagonista guarda um segredo que pode afetar todos ao seu redor? Será que ele vai se autodestruir ao ouvir más notícias das quais ainda não estava preparado?
Obs.: Explore o verdadeiro eu de seus personagens no contexto da história e a Tensão muito provavelmente vai ser criada.
8 - Cliffhangers (ganchos)
Cliffhangers colocam grandes questões no final de um capítulo ou trecho. Normalmente, um momento de angústia durante um evento dramático no meio da ação, em vez de permitir que ele chegue até a sua conclusão natural.
Por exemplo, o protagonista está prestes a empurrar o vilão para fora do barco. Isso atiçará o leitor a querer saber como vai se desenrolar, mas você pode oferecer uma surpresinha no final do capítulo. Pode ser desde uma informação nova ou uma reviravolta na história. Vai que o vilão consegue pegar a faca escondida, ou o protagonista, ao tentar empurrar o antagonista ao mar, percebe uma tatuagem que o lembre algo importante — e você nem precisa dizer o motivo!
Deixe que o leitor imagine: “Quê? Essa tatuagem não apareceu antes?!”
Por que o Conflito é importante na história?
Em um livro, o Conflito é uma situação ou encontro entre personagens que resulta em desafios e oposições. Pode ser que tenham objetivos opostos ou um personagem que luta contra seus demônios internos. Às vezes, o Conflito reside entre os personagens e o ambiente... É indiscutível que esse seja um dos elementos mais importantes da ficção, afinal, sem um conflito não há movimento nem impulso narrativo.
Em uma história, o Conflito fornece a Tensão. Quando um antagonista tem objetivos opostos ao do protagonista, sabemos que apenas um pode ser vitorioso. Isso cria suspense enquanto nos perguntamos quem triunfará — na verdade — é mais em como será a vitória.
Esse elemento fornece os riscos e as probabilidades que criam ações. Coloquemos em exemplo o “Senhor dos Anéis”... Se a busca de Frodo para destruir o Anel fosse simples e fácil, a história seria previsível e entediante. Conflitos menores e maiores ao longo do caminho criam arcos menores de Tensão e alívio. Múltiplos Conflitos de tamanho variados dão às histórias sua forma e caráter único.
E, curiosamente, é um dos erros mais comuns entre escritores iniciantes. Eles estão tão preocupados em criar o mundo e os personagens que esquecem como desencadear oposições e ações, produzindo uma história desprovida de qualquer conflito.
O conflito é o momento no qual os personagens podem crescer e mudar. Ao enfrentar adversidades internas e/ou externas, os personagens passam a ver as coisas diferente ou ganham forças. Independente de superar as falhas ou desenvolver mais, o conflito é quem rege a chave da mudança.
Quais manifestações o Conflito pode ter na história?
Como um elemento literário, o Conflito apresenta em si o valor de discordância, incerteza ou choque de valores, motivações, desejos ou ideias. É com ele que se faz grandes ações na vida dos personagens — até na nossa — e que impulsiona a história adiante.
Dessa forma, todos os conflitos literários podem ser classificados de duas formas:
Conflito interno é quando um personagem luta contra seus próprios desejos ou crenças. Acontece em sua mente e direciona o desenvolvimento como personagem;
Conflito externo é quando o personagem é colocado contra algo ou alguém que não pode controlar. Forças externas que atrapalham seu caminho e criam tensões enquanto o personagem tenta alcançar seus objetivos.
Os 6 tipos de Conflito
Assim como a maioria das coisas na vida, são necessários dois ou mais para criar o conflito. O que você escolher para enfrentar seus personagens terá um efeito significativo no tipo de história que escreverá.
É bom deixar claro que, apesar de muitas histórias conter vários conflitos, geralmente há um que sempre será o foco, o conflito principal, enquanto os outros agem de conflitos menores ao longo do caminho. E, em alguns casos, um autor consegue aplicar o uso de vários conflitos como principais. Tome o exemplo de “A Dança da Morte”, de Stephen King, onde grande parte da humanidade é exterminada por um vírus, fazendo-o aplicar conflitos de pessoa contra pessoa, pessoa contra natureza e pessoa contra sobrenatural.
Além disso, por mais que veja em outros lugares a menção diferente da forma de se referir os conflitos — “pessoa contra tal”, “personagem contra isso”... — não faz tanta diferença no final, todos estão corretos.
1 – Pessoa contra pessoa
É o conflito mais comum da ficção. Pode se manifestar como as necessidades ou desejos de um personagem estão em conflito de outros. Pode ser descrito como uma luta direta ou tão misturada e cheia de nuances quanto a luta contínua pelo maldito trono.
Os conflitos de pessoas contra pessoas têm várias possibilidades interessantes. Por exemplo, escrever sobre duas pessoas de diferentes opiniões tendo um debate, mas, se prestar atenção, não há certo ou errado, apenas que os dois acreditam que aquilo que dizem está correto. O que leva a se desafiar para que esses tipos de personagens se provem naquele momento.
Por outro lado, uma história com um vilão óbvio e inequívoco pode ser divertida de ler e escrever. Ambas as abordagens são formas legítimas de desenvolver um “pessoa contra pessoa”.
Assim, podemos ver que esse tipo de conflito pode apresentar desde a luta contra alguém pela sobrevivência ou outra razão, até em uma história de mistério o qual o personagem tenta descobrir quem foi o responsável pelo crime.
E um aviso... Se seu romance for entre muitas pessoas, o conflito pode acabar sendo o “pessoa contra sociedade”.
2 – Pessoa contra natureza
Nesse conflito, um personagem é colocado em oposição à natureza. Pode ser o clima, a natureza selvagens ou um desastre natural. Imagine o seu personagem à deriva no mar, perdido e com fome. Ele luta para conseguir os poucos peixes que encontra e até os tubarões aparecem para ameaçá-lo e deixá-lo sem alimento. Essa é a essência do conflito do personagem contra natureza: a luta contra as emoções humanas, enquanto a natureza avança sem se importar.
Um protagonista que está perdido na floresta ou que está sob ataque de animais selvagens, ou mesmo que busca a sobrevivência enquanto uma terrível tempestade acontece. Todos estes são conflitos de pessoa contra natureza.
Esse tipo de conflito é caracterizado por ambientes que forçam o personagem lutar. E que fique bem claro que o tipo de conflito não dita o gênero da sua obra, apenas que é um fator a ser considerado e pensado em sua obra.
Leve em consideração um arco de um personagem perdido em uma ilha ou em uma montanha porque fugiu de outra coisa. Nesse caso, apenas o arco vai ser o conflito, não a história, que pode ser muito bem uma fantasia, aventura ou ação.
Geralmente, histórias utilizam o “pessoa contra natureza” como conflito secundário em suas histórias.
3 – Pessoa contra ego
Este é um conflito interno, o que significa que a oposição que o personagem enfrenta vem de si mesmo. Pode ser a luta para discernir qual é a escolha moral “certa”, ou também pode envolver problemas mentais.
Normalmente esse conflito só é usado como secundário na ficção. Não é incomum que o protagonista esteja lutando com algum aspecto da autossabotagem. Pode ser um medo, um passado difícil, um vício ou uma tendência de continuar escolhendo relacionamentos errados.
Mesmo que sua obra não busque esse conflito como principal, é sempre bom adicionar na sua história para complementar o desenvolvimento de seu personagem e aumentar a complexidade de significados que passará em sua obra.
4 – Pessoa contra sociedade
Um conflito externo que ocorre quando o protagonista é colocado em oposição à sociedade, ao governo ou a uma tradição cultural ou norma social de algum tipo. Os personagens podem ser motivados a agir contra sua sociedade por uma necessidade de sobreviver, um senso moral de certo e errado, ou um desejo de felicidade, liberdade, justiça ou amor.
Nesse caso, não existe um único antagonista, mas um grupo de antagonista.
Como a sociedade é composta de indivíduos, esse tipo de conflito também incluirá elementos significativos de pessoa contra pessoa. No entanto, quando o conflito de pessoa contra pessoa inclui uma oposição ao sistema e modo de vida de outros, torna-se um conflito de pessoa contra sociedade.
5 – Pessoa contra sobrenatural
Colocar personagens contra fenômenos como fantasmas, deuses ou monstros, aumenta o risco de um conflito criando um campo de jogo desigual. O conflito sobrenatural também abrange personagens, como Harry Potter ou Odisseu, que têm um destino ou predestinação e precisam lutar para aceitar os sacrifícios que vêm junto disso.
O sobrenatural aqui pode ser considerado um termo amplo e que abrange qualquer entidade desconhecida. Assim como no exemplo anterior, a luta de um homem para escapar de seu destino é um conflito de pessoa contra sobrenatural.
Desde que o indivíduo/entidade não seja muito próximo a humana, encaixará nesta categoria, assim como as histórias com antagonistas inexplicáveis.
Conflitos contra alienígenas podem ser classificados como “pessoa contra sobrenatural” ou “pessoa contra pessoa”, dependendo dos tipos de poderes e tecnologia que os alienígenas possuem. Em história de ficção científica, onde humanos e alienígenas estão praticamente em pé de igualdade, os extraterrestres podem ser considerados iguais às pessoas por causa do conflito. Já caso esses aliens superem muito o poder dos seres humanos, quase ou totalmente que inexplicável, então pode muito bem cair como sobrenatural.
6 – Pessoa contra tecnologia
Nesse caso, um personagem está em conflito com algum tipo de tecnologia. Por mais que nossas vidas se tornem mais dependentes e vulneráveis à tecnologia, o uso disso como conflito tende a crescer.
Há centenas de anos, já houve uma história que utilizou exatamente este tipo de conflito. Frankenstein conta a história de uma criatura criada por meios científicos, logo, é um ótimo e clássico exemplo de conflito de pessoa contra tecnologia.
Também podemos utilizar grandes franquias do cinema, “Matrix” e “Exterminador do Futuro”. Os dois se tratam dos humanos contra uma tecnologia poderosa.
No entanto, esse não é um tema estritamente voltado ao gênero de ficção científica. Um suspense pode lidar com um protagonista que tenta conter uma tecnologia desonesta ou ataques de hacking. Pode até mesmo ser que o protagonista precise pilotar um avião fora de controle ou um submarino que está prestes a explodir.
Obs: Esse artigo foi escrito por Rose Kethen, membro ilustre da Novel Brasil e da Novel Mania. Eu, Rencmps, apenas editei e organizei o artigo.
コメント